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Foto do escritorJose Edmar Gomes

Dra. GLÁUCIA SOUTO

Atualizado: 5 de ago. de 2022

Legislação de defesa das mulheres precisa ser efetivamente aplicada


Feira da Arte e Direitos Humanos
Dra. Gláucia Souto: Não podemos aceitar que um indivíduo que pratica violência doméstica seja beneficiado por institutos jurídicos

O mês de julho de 2022 não terminou bem para as mulheres do DF. No domingo 31, um jovem de 23 anos confessou ter matado, a facadas, a companheira, conhecida como Jackeline, na região do Itapoã. De acordo com informações da 6ª DP do Paranoá, que efetuou a prisão do assassino, com mais este crime, o número feminicídios no DF, chega a oito, nos primeiros sete meses do ano.


Por outro lado, dados da Secretaria de Segurança Pública aponta um alto índice de estupros de crianças e adolescentes. Nos três primeiros meses de 2022, foram registradas 130 ocorrências, 81 delas apontando vítimas vulneráveis, menores de 14 anos.


Tal realidade, que incomoda a população da Capital da República, também preocupa a Dra. Gláucia Souto, advogada, há 25 anos, que preside a Comissão de Violência Familiar e Relações Íntimas de Afeto da OAB-DF, Subseção de Sobradinho.


A advogada foi a principal atração da 4ª edição da Feira da Arte e dos Direitos Humanos, no domingo 3 de julho, evento em defesa das mulheres e contra a violência, promovido pela Associação Artise de Arte, Cultura e Acessibilidade; Associação das Mulheres de Sobradinho II e Centro de Reabilitação Mar Vermelho; com apoio do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.


A advogada defendeu como veemência a aplicação da legislação de defesa das mulheres, lamentando que, algumas vezes, os agentes públicos deixem de fazê-lo, em prejuízo do direito das mulheres, das crianças e adolescentes.

Feira da Arte e Direitos Humanos
Mulheres de Sobradinho e região atentas às recomendações da advogada Gláucia Souto

Após a palestra, a Dra. Gláucia Souto concedeu a seguinte entrevista ao jornalista José Edmar Gomes, onde reafirma a necessidade de aplicação da legislação pertinente aos casos de violência doméstica. Confira:


José Edmar Gomes – Qual é a situação das mulheres da Saída Norte e da periferia de Sobradinho, em relação à violência doméstica?

- Dra. Gláucia Souto - É de muita vulnerabilidade e de um certo abandono, por falta de aplicação das políticas públicas. É necessário que mulheres e homens deem as mãos e comecem a levar adiante, no plano educacional, o conhecimento da legislação que combate à violência doméstica, o que vai reverberar no ambiente familiar e, desta maneira, será possível trabalhar a redução da violência doméstica e, futuramente, erradicá-la da nossa região.

- Esta situação de vulnerabilidade da mulher, não decorre do machismo estrutural, arraigado na sociedade brasileira, desde os tempos coloniais?

- O machismo estrutural é algo enraizado na cultura brasileira (ou falta dela), lamentavelmente. Os homens perguntam: - por qual motivo, você cortou o cabelo?; - vai sair com esta roupa curta por que? O que os outros vão pensar de você?; só podia ser mulher para dirigir assim...

Então, precisamos criar condições, no âmbito educacional, para que nossas crianças cresçam com um novo olhar e a própria instituição familiar tenha novas estruturas para identificar e saber erradicar o machismo estrutural.


- A situação das mulheres é ruim hoje e já foi pior, desde os tempos bíblicos. Qual o papel de Deus nesta realidade?

- A pergunta é forte e difícil de responder. Mas eu posso dizer o seguinte: Deus fez o homem e a mulher. Para Ele, todos são seus filhos. Ele nunca colocou o homem, nem a mulher, em situação de diminuição. Na verdade, a Escritura Sagrada coloca as mulheres como procriadoras e os homens como provedores. Porém, nós já tivemos um avanço social muito grande... De tal maneira, que eu não posso dizer que Deus tinha algo contra as mulheres. Posso dizer, sim, que na época em que a Escritura foi escrita, nas suas interpretações, as mulheres foram colocadas como procriadoras e os homens como provedores, mas esta situação tem mudado socialmente e cabe a nós adaptarmo-nos a estas mudanças. Quem tiver dificuldade com estas mudanças deve entender que todos somos seres humanos e precisamos ser respeitados como tal.


- Falando em direitos, no que concerne ao direito à vida e ao aborto, quem tem mais direito: a mãe que quer evitar uma gravidez indesejada ou o feto, que também tem direito à vida, como ser humano, e não pode se defender de um aborto?

- O fato é que temos legislação que regula o assunto. Esta legislação coloca, por exemplo, a questão do estupro, o estupro de vulnerável. Uma adolescente menor de 14 anos pode se tornar vítima de estupro de vulnerável e ela tem direito ao aborto, como qualquer mulher que é vítima de crime sexual.


- Sim, mas quando se trata de uma criança, são os pais que decidem por ela. E se eles decidirem contra a lei?

- A criança tem a representação de seus genitores. No caso que aconteceu, recentemente, em Santa Carina (Caso de Tijucas-SC, em que a juíza Joana Ribeiro Zimmer decidiu manter uma menina de 11 anos num abrigo do estado para impedir que ela fizesse um aborto), a mãe pediu socorro e a legislação acabou não sendo cumprida. A legislação é muito clara e diz que qualquer mulher, gênero feminino, vítima de crime sexual, tem direito ao aborto legal, sem precisar lavrar boletim de ocorrência e muito menos de autorização judicial. Isso não foi consentido àquela criança. O que é um absurdo. É claro que existe uma corrente conservadora, que entende a situação de forma distinta, mas a nossa legislação, hoje, preconiza que, nesses casos, o aborto é legal, porque a criança foi vítima de um crime sexual. Inclusive, temos uma decisão do ministro Edson Fachin, colocando que as políticas públicas precisam ser empregadas corretamente, pelos representantes do Estado, para garantir a igualdade entre homens e mulheres e não a desigualdade como existe hoje.


- Não só neste caso de Santa Catarina, mas em outros, o Estado tem falhado na aplicação da legislação, por que?

- Na minha visão, existem falhas. Não podemos aceitar que um indivíduo que pratica violência doméstica - seja contra a mulher, crianças, adolescentes, LGBTA QUIA+; seja nas questões de intolerância religiosa e racial - independentemente do grau da violência, é inadmissível que esta pessoa seja beneficiada por institutos jurídicos. Precisamos que o Estado, através de seus representantes, aplique efetivamente aquilo que está escrito na legislação. Aquilo que os tribunais superiores colocam nas suas súmulas, para se garantir o direito dessas vítimas, para que elas não se tornem, corriqueiramente, vítimas desta violência.


- A Sra. entende que o Brasil está andando pra trás, como os EUA andaram, quando a Suprema Corte proibiu o aborto?

- Neste momento, o Brasil tem a terceira melhor legislação do mundo, no que se reporta à violência doméstica contra as mulheres...


- Mas a nossa legislação, ainda que próxima do ideal, pode ficar só no papel...

- O problema é este: nós temos algumas autoridades que não dão atenção correta às mulheres vítimas de violência doméstica. Muitas mulheres, crianças e adolescentes acabam se sentindo desprotegidas e muitos homens dizem que: tá vendo, fui lá, respondi e ganhei o direito de participar apenas de um curso de reeducação e vou continuar agindo da mesma forma.

- Estas atitudes não seriam o machismo estrutural se mostrando da forma mais clara possível?

- Acredito que sim, pois há muitas situações em que as autoridades públicas agem com machismo estrutural e não garantem o direito à proteção. Não é só o direito previsto na Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) e na Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), precisamos ter um olhar acolhedor e muito mais aperfeiçoado da legislação que está em vigor.

Feira da Arte e Direitos Humanos

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